quinta-feira, 30 de maio de 2024

“Amor sem Tréguas” – um livro notável --- por Armando Lopes Rafael (*)

 



    Escrito por Adriana Aires de Alencar, o livro “Amor sem Tréguas” é relevante. 

   A obra resgata a história de vida dos pais da autora – José Aires de Alencar (Zito) e Teresinha Sampaio – complementado com narrações sobre os conflitos ocorridos na cidade de Exu (PE), iniciados num Domingo de Ramos, 10 de abril de 1949. Na manhã daquela data foram assassinados os dois coronéis de maior projeção daquela cidade: Cincinato de Alencar Sete, ex-prefeito do município e Romão Sampaio Filho. A partir daí surgiu uma verdadeira vindita entre os clãs Alencar e Sampaio. Trazendo resultados funestos. Ao longo dos trinta anos seguintes, 48 pessoas dessas famílias foram assassinadas.   A dor advinda dessas mortes só Deus e as pessoas que perderam seus entes queridos conhecem.

Uma pequena diáspora sertaneja

    Também para a comunidade exuense foram visíveis os prejuízos advindos dessa guerra familiar. Pelas décadas seguintes, aquele município viu estagnado seu progresso e desenvolvimento. Famílias inteiras – integrantes de ambos os clãs – abandonaram Exu e foram a viver noutros estados nordestinos. Várias delas buscaram até estados de distantes regiões brasileiras, tentando refazer a normalidade de suas vidas em Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo, São Paulo, Tocantins, Distrito Federal, dentre outros. 

   No entanto, a noite negra dessas violências e desencontros trouxe, com a claridade do término da madrugada, a história de um amor impossível. Ainda jovens, Zito Alencar e Teresinha Sampaio – cada um pertencente a um dos clãs em litígio – apaixonaram-se um pelo outro. E esse amor veio a provar a veracidade daquela frase escrita por São Maximiliano Kolbe: “O ódio não é uma força construtiva; A força construtiva é o amor” ...

A autora do livro

    Adriana Aires de Alencar, médica ginecologista, obstetra e colposcopista, é o quarto rebento dos seis filhos advindos do casamento entre Zito e Teresinha. Dir-se-ia que o ambiente de amor doméstico vivenciado pela autora – desde a mais tenra infância – seguido do conhecimento posterior sobre os fatos trágicos vividos pelas famílias em conflito, a levou a dar vazão a uma inspiração transcendental para escrever sobre essa “guerra” dos clãs de Exu. O que Adriana fez com maestria! A leitura do livro, apesar das tristezas dos fatos, torna-se agradável. Prende a atenção do leitor do começo ao fim.

    No final da obra, no capítulo 18, (“Uma história ainda não contada”) Adriana escreveu com sinceridade e humildade: “Não existe fantasia no que escrevo, e muitos anos se passaram para que eu pudesse alcançar o entendimento e a grandeza dessa relação entre meus pais, de personalidades bem diferentes, mas em conjunção carnal, espiritual e afetivo eram um só”. 

     Encerro este pequeno artigo com um parágrafo escrito por Cincinato Alencar, irmão de Adriana, que disse: “Esta história precisava ser contada por alguém que estivesse bem pertinho, alguém que sentisse o cheiro e ouvisse a voz, acompanhando os passos percorridos pelos dois, e tivesse a capacidade de guardar em sua memória as experiências mais marcantes para nós...Situações...ocorrências....Acreditem! Não tinha outro filho(a) que tivesse esta “determinação” como Adriana tem! Acho que ela herdou a força e coragem de nossa mãe, e a sensibilidade na escrita do nosso pai”.

    Um excelente livro!


(*) Armando Lopes Rafael é historiador.
Sócio do Instituto Cultural do Cariri (Crato-CE) e Membro-Correspondente da Academia de Letras e Artes Mater Salvatoris, de Salvador (BA).

      Crato (CE), 30 de maio de 2024, Dia de Corpus Christi.